quarta-feira, 2 de março de 2016






A ARTE DE ALFABETIZAR


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Quando se fala em alfabetização o que vem à cabeça da maioria das pessoas é o aprendizado da leitura e da escrita e que isso, geralmente, ocorre na escola por volta dos sete anos de idade. Para muitas famílias, a vida escolar do filho só é reconhecida com o ingresso da criança na classe de alfabetização.
O que poucos sabem é que todos, ao nascer, já estão imersos no mundo letrado, seja no contato com brincadeiras ou jogos, revistas em quadrinhos, rótulos de produtos, outdoors, cartas ou bilhetes, faixas na rua, poesias, músicas, entre outros. De acordo com a professora Melissa Fortes de Araújo, do Instituto Bisinotto, a criança, desde muito cedo, começa a perceber a função simbólica da escrita, mesmo que não consiga verbalizar isso. E foi o letramento que trouxe uma revolução para essa ideia.
Entende-se como letramento as práticas de uso social da leitura e da escrita enquanto a alfabetização engloba as atividades de introdução da criança ao sistema alfabético e suas convenções.
Níveis da escrita
Emilia Ferreiro, psicóloga argentina, estudou o comportamento das crianças em relação à escrita e percebeu que elas percorriam no seu desenvolvimento o mesmo trajeto da humanidade na organização de seu conhecimento: o ser humano partiu do desenho e construiu um alfabeto. De maneira similar, a criança inicia a representação do mundo por meio de gestos, desenhos e chega ao símbolo e as regras sistemáticas “reconstruindo” o código linguístico utilizado na sociedade. A psicóloga descreveu os níveis de escrita que as crianças percorrem e como, por esse processo, conseguem se alfabetizar via letramento:
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E o lugar do professor e da escola?
O educador funciona como mediador nesse processo de aprendizagem. Os erros não são considerados como tal, mas como indicador do nível em que o aluno está neste processo e o que deve ser estimulado para que ele avance. “É pela escrita espontânea da criança, de jogos, de brincadeiras e de vários outros meios oferecidos pelo mundo letrado, como livros, revistas, cantigas, rimas, que o professor pode desafiar a curiosidade do aluno”, afirma Melissa Fortes.
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De acordo com a professora, foi dessa forma que os educadores perceberam que a alfabetização é bem mais significativa quando não é imposta ou ensinada como algo pronto e sem sentido para o aluno e, sim, quando estimulada a partir das descobertas da própria criança. Tem que existir uma troca de conhecimentos que considera a criança e marca a alfabetização como uma aprendizagem para toda a vida.
A alfabetização é o momento mais importante pelo qual um aluno passa, porque é partir desse momento que ele passará a compreender verdadeiramente o mundo em que vivemos. Espera-se que ao final desse processo o aluno saiba ler e escrever, mas acima de tudo, compreenda e faça bom uso do que lê. Para que o educador alcance esse objetivo, é necessário que, antes, compreenda algumas coisas muito importantes e a primeira delas é compreender o que são símbolos. 
Pode parecer estranho, mas se pensarmos que as letras representadas no papel em branco são símbolos dos sons da fala fica fácil explicar para o aluno o que são “os risquinhos pretos numa folha branca”. (LEMLE, 2007, p. 7). Pode parecer simples, mas não é. Mas, afinal, o que são símbolos? São representações de algo, por exemplo, quando o sinal está vermelho, todos, sabemos que aquele símbolo representa a palavra “pare”. Logo, todos os motoristas esperam até que o outro símbolo verde diga “siga”. 
Aprendida a relação simbólica das letras com os sons da fala é importante mostrar aos alunos as diferenças sutis existentes em muitas letras que confundem a criança em fase de alfabetização como o “p” e o “b”. Isso levará ao próximo passo que é descobrir que essas sutilezas acontecem não só na escrita, mas também na fala. Ao final fazer, com que a criança perceba as palavras e se conscientize delas para que compreenda que é a organização delas que nos permite a escrita de um texto. 
A leitura é fundamental quando se entende o que se lê, pois será a partir dela que o aluno terá um melhor desempenho nas demais disciplinas. Segundo Cagliari (1995), “a grande maioria dos problemas que os alunos encontram ao longo dos anos de estudo, chegando até a pós-graduação, é decorrente de problemas de leitura” (p. 148). São alunos que não compreendem o texto e, por isso, não conseguem interpretá- -lo, não compreendem o enunciado dos exercícios de matemática e por consequência não conseguem resolvê-lo, ou seja, “tudo o que se ensina na escola está diretamente ligado à leitura e depende dela para se manter e se desenvolver” (p.148). 
A escrita, por sua vez, inicia-se na alfabetização com a letra de forma – que é mais fácil para a criança iniciar a aprendizagem – depois de ter domínio desse tipo de letra, são forçadas a escreverem com letra cursiva o que exige um esforço grande visto que a letra cursiva é mais elaborada e apresenta particularidades daquele que escreve. Por isso, ler algo com letra cursiva é mais difícil para a criança do que ler um texto que foi escrito com letra de forma. Não estamos aqui dizendo que a letra cursiva não deva ser ensinada nas escolas, pelo contrário. Apenas acreditamos que o momento de introdução de uma letra diferente deve ser repensado. Seria muito mais fácil para a criança se ela aprendesse a letra cursiva depois de já ter domínio da leitura e escrita, mas infelizmente não é o que tem acontecido nas escolas. 
Outro aspecto que deve ser levado em consideração, pelo educador, no momento da alfabetização, é o perfil do público que ele irá alfabetizar. Crianças que têm em casa exemplos de leitores e escritores compreenderão com mais facilidade a importância e a finalidade da alfabetização e, assim, aprenderão mais facilmente. Uma vez que serão constantemente estimuladas pela família. Por outro lado, se temos na sala de aula crianças que não possuem esse exemplo, a conduta do professor deve ser diferenciada. 
No primeiro caso, poderemos escolher o método que julgamos mais interessante ou mais eficaz que não teremos grandes dificuldades em alcançar os objetivos. Porém, no segundo caso, a primeira atitude do professor deve ser fazer com que os alunos percebam a utilidade e a importância da escrita. É aqui que encontramos o grande nó na alfabetização. 
As práticas que são utilizadas desde o início dos tempos não conseguem cumprir esse papel de estimular o aluno. Uma prática comum nas classes de alfabetização é o ditado de palavras soltas, sem nenhum significado e, pior ainda, quando a educadora as pronuncia de forma artificial. Pensando ajudar os alunos, ela os confundem ainda mais, pois eles nunca ouviram – nem vão ouvir – as pessoas dizendo aquelas palavras como a professora diz no momento do ditado. 
Normalmente, as educadoras apresentam apenas um gênero textual aos alunos e, assim, fazem com que a riqueza da nossa língua não seja apresentada a eles. A criança em fase de descoberta precisa ter contato com os mais variados gê- neros textuais para que possa aprender a narrar, argumentar, criticar, mas sem perder a chance de conhecer a beleza de uma poesia. Percebemos, com isso, que, no processo de alfabetização, leitura e escrita caminham juntas, porque “quem escreve, escreve para ser lido”. (CAGLIARI, 1995, p. 149). 
Quem não se lembra do famoso trecho? “Eva viu a uva”. “A uva é da vovó”. O que tem de estimulante para uma criança ser alfabetizada dessa forma? O método funciona. Afinal, a maioria de nós foi alfabetizada por ele, não é esse o nosso questionamento, mas será que não podemos fazer do momento mais importante de nossa vida escolar um momento prazeroso? Muitas educadoras, quando questionadas, dizem que preferem o método que utilizam há anos porque sabem que ele funciona. 
A alfabetização se tornou uma preocupação, em 1990, quando ocorreu a Conferência Mundial de Educação para Todos. Nessa conferência, discutiu-se sobre a importância da Educação Básica como fundamental para o desenvolvimento de uma nação. Desde então, diversos programas, projetos e políticas tem sido criados na tentativa de erradicar o analfabetismo no Brasil. 
Todo esse esforço fez com que a maioria da população aprendesse, ainda que precariamente, a ler e a escrever como nos mostram os dados recentemente publicados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística referentes ao Censo Demográfico de 2010. Segundo esses dados, 93,1% das crianças de 6 a 11 anos, residentes em Belo Horizonte, estão alfabetizadas, no entanto, sabemos bem que para considerarmos uma pessoa alfabetizada é necessário que ela saiba mais do que ler e escrever. 
Cagliari nos esclarece sobre isso. A leitura é, pois, uma decifração e uma decodificação. O leitor deverá em primeiro lugar decifrar a escrita, depois entender a linguagem encontrada, em seguida decodificar todas as implicações que o texto tem e, finalmente, refletir sobre isso e formar o próprio conhecimento e opinião a respeito do que leu (CAGLIARI, 2000, p. 150). 
Assim, entendemos que alfabetizar é uma arte, e como arte não pode ser processo simplesmente mecânico, necessita também de sentimento. O professor precisa ter sensibilidade para perceber na classe os interesses e, assim fazer com que os alunos sejam estimulados a pensar e descobrir o desconhecido, porque como diz Rubem Alves “o pensamento é como a águia que só alça voo nos espaços vazios do desconhecido. Pensar é voar sobre o que não se sabe” (2008, p. 11). 
Como arte também não possui receita para dar certo. O que se sabe é o que não deve ser feito, ou seja, o que não é arte: não faça com que o escrever seja destituído de significado, não faça com que o aluno reproduza modelos e copie excessivamente, isso priva-o de pensar e criar. “Não existe nada mais fatal para o pensamento que o ensino das respostas certas”. (RUBEM ALVES, 2008, p. 12).
 No processo de formação de um indivíduo, os erros são fundamentais e eles precisam acontecer para que o aprendizado se constitua. Como arte, desperta o que o outro tem de melhor por meio da expressão das emoções, da sua história e da sua cultura, e tem infinitas possibilidades seja no fazer, seja nos resultados alcançados. A escolha é do artista que alfabetiza e muda, para melhor, a vida dos seus alunos.

BIBLIOGRAFIA:
OLIVEIRA, Thais Abrantes de. A arte de alfabetizar. Revista do instituto de Ciências Humanas, v.8, n.10, p. 55-58, jul-dez, 2013.
Disponível em: http://novalimaperfil.com.br/site_nlperfil/index.php?option=com_content&view=article&id=465:alfabetizacao-e-letramento-a-arte-de-ensinar-a-ler-e-escrever-para-a-vida-toda&catid=4:educacao&Itemid=21; file:///C:/Users/Gabriela/Downloads/8272-30141-1-SM.pdf. Acesso em: 02/03/2016.
Imagens disponíveis em: http://globoesporte.globo.com/pi/noticia/2013/08/esperanca-capoeira-faz-criancas-do-piaui-aprenderem-ler-e-escrever.html; http://www.obrasileirinho.com.br/criancas-aprendem-mais-escrevendo-a-mao/; http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/aprender-a-ler-349318.shtml. Acesso em: 02/03/2016.

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